É verão, a estação que traz a hora dourada mais mágica do ano. Pelo menos é assim que Lacarmí sonha no conforto de seu caixão. De olhos fechados pode enxergar as exatas matizes dançando no céu, o brusco dourado desaparecendo para dar lugar às tonalidades do azul. O momento da troca, o minuto certeiro para que as criaturas da noite levantem das tumbas. Ela então se espreguiça languidamente em mais uma noite quente de verão.
Ah! A saudade de besuntar o corpo com bronzeador na esperança de que o astro rei emprestasse uma migalha de seu fogo celestial… mas Lacarmí sabe que sua eternidade é feita de noites. Eternas noites, a eterna palidez não cede aos apelos das hemácias frescas que descem pela garganta. O que resta? Refugiar-se na noite e abraçar a angústia? Nunca! Nunquinha! Lacarmí serve uma boa dose de sangue como um coquetel, enfeita as madeixas com flores coloridas e vai brincar de tela despindo o alvo corpo e se entregando ao azul da lua e ao amarelo do refletor no jardim. Transforma-se em céu, as luzes coloridas dançam sob sua pele como em uma certa noite estrelada onde os astros brilham no mais intenso dourado celestial.